sábado, 24 de outubro de 2009

Literaturas Eletrônicas


Vídeo Poema, Fanfic, Flash Poema: Literaturas Eletrônicas?
Fabiana Móes Miranda

A cibercultura e o redimensionamento das perspectivas textuais relacionados aos hipertextos têm trazido vários questionamentos para a crítica literária. Neste contexto, uma diversidade de textos literários é apresentada sem que se torne claro, a primeira vista, quais são os diferenciais que surgem juntamente com estas obras. Aqui, quero apenas demonstrar algumas das “complexidades” que envolve a literatura na era digital.


Podemos começar verificando algumas situações encadeadas: a) os textos literários digitais surgem num contexto específico da cultura contemporânea; b) no contexto da cultura contemporânea há a necessidade da convergência de mídias; c) a convergência de mídias impõe ferramentas e suportes específicos para a sua realização; d) a realização das mídias no ciberespaço cria novas modalidades semióticas.


Levando em consideração o que foi dito acima, podemos verificar a que texto eletrônico estou me referindo pela forma como esses fatores se articulam. Se pensarmos em questões de gêneros textuais talvez fique mais claro definir os textos que surgem no ciberespaço em sua diversidade e pluralidade.


Podemos colocar todos estes textos no amplo gênero da literatura eletrônica – aquela possibilitada por um meio eletrônico (celular, ipod, câmeras digitais, etc.) – mas, precisamos definir os “subgrupos”. Alguns podem se estruturar a partir da recepção literária (como as fanficções), outros podem ser híbridos, se estruturando a partir de um texto pré-existente, inédito ou não, e a partir da transposição imagética e sonora para o espaço virtual (vídeo poemas); há os que se estruturam apenas por meio da máquina (programas de composição aleatória de textos) e ainda, textos totalmente estruturados na interação homem/máquina (como a ergódica, ou seja, aquela que precisa de interferência do autor/leitor).


Construir um vídeo poema requer tantas “autorias” quanto construir um fanvídeo ou um flash poema (poema digital). O que precisamos, entretanto, é entender qual a “função” destas autorias. Um flash poema tem, além do autor, um recurso (programa) da qual depende totalmente a realização do seu texto; Um fanvídeo depende de uma comunidade relacionada à fancultura (desde amantes de livros até fãs de séries de TV) e à interatividade online; No vídeo poema, ou um poema por celular, o autor (que faz o texto) requer o meio eletrônico (câmera, etc.) e, por vezes, um encarregado da produção (edição, montagem, etc.)


O que pudemos perceber até aqui é que a produção literária eletrônica é um campo vasto e que necessita de um “avanço” dos estudos críticos.


Nesta Babel de textos eletrônicos, tudo parece impreciso e, apesar disto, possui regras próprias bem definidas. Neste contexto, precisamos definir o texto eletrônico e o hipertexto. Esta diferenciação parece desnecessária já que o todo hipertexto é um texto eletrônico, mas temos que admitir que nem todo texto eletrônico é um hipertexto. Podemos observar que os blogs literários são formas hipertextuais (já que comportam links e escrita para o espaço virtual) e, assim, permitem modos de interação (comentários, revisões, recortes/acréscimos, exclusão, além de toda a formatação e publicação). Um texto eletrônico, muitas vezes é uma composição definitiva (vídeo poema; flash poema) que não necessita de intervenção e só necessita ser colocada online para assumir sua condição virtual.


Outra questão que posso ressaltar é a configuração semiótica presente, de formas diferentes, nestes textos eletrônicos. O hipertexto consegue agregar multimídias em seu “corpo”, mas não integra de forma uniforme estas diversas estruturas, por isso encontramos sites que arquivam vários modos de produção de um mesmo texto. Por exemplo, uma versão digitalizada e um vídeo com a performance do autor lendo seu texto, ou imagens que se aproximem da representação do texto escrito. Esta performance também faz parte do vídeo poema que, por seu lado, não permite interferências já que é um texto determinado como um “produto final”. Entretanto, o que certos autores (HAYLES: 2008; FRUIN: 2008)* consideram literatura eletrônica é um texto que, além de integrado totalmente (texto, som, imagem), permite a interatividade com o leitor, que pode interferir no texto ou criar junto ao texto.


De certa forma, não basta uma “ferramenta” eletrônica na mão e uma idéia na cabeça. Criar enredos e dispor em meio eletrônico pode ser estudado pela ludologia (estudo dos jogos/games), mas a composição literária (que desde sempre não se contentou com lápis e papel) precisa de outros “recursos”, que poderiam ser encontrados na dinâmica texto/outras mídias na conformação de uma obra integrada. Sabemos que a literatura não precisa ser eletrônica, mas é preciso que o texto eletrônico mostre-se indispensável como literatura.
....................................
* OLIVEIRA, Poliana Barbosa M. O que é literatura eletrônica? Monografia, UFPE: Recife, 2009.